Eduardo Ritter
Dois livros que eu não indico
Eduardo Ritter
Professor do Centro de Letras e Comunicação da UFPel
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Desde que comecei a escrever aqui no Diário Popular, já indiquei dezenas de livros aos meus escassos, mas fiéis, leitores. Desta vez vou fazer o processo inverso: quero falar sobre dois livros que li tempos atrás e que não indico a ninguém. Afinal, sinto-me na obrigação de precavê-los dos livros chatos e cansativos, da mesma forma que sugiro a leitura de obras que gostei e que achei empolgante por um ou outro motivo. Sacumé, qualquer dia desses, algum leitor mais crítico pode sair falando por aí: "tudo que esse cara lê acha bom e indica na coluna. Até bula de remédio ele chama de 'imperdível'". Então, conto aqui brevemente duas experiências frustrantes que já vivi ao pegar um livro para ler.
O primeiro traz um enredo criativo que talvez até agrade alguns leitores, mas que não tive jeito de dar match. Trata-se de Andarilho das Estrelas, de Jack London (1876-1916), autor que tem algumas obras geniais, mas que nessa ficou devendo. Achei a narrativa tão monótona e sem graça que não consegui chegar ao final. No início até considerei interessante, entretanto, a história não anda. Resumidamente, o personagem é preso, sofre várias torturas, e, já sem saber mais o que fazer para fugir da dor, ele resolve "morrer" um pouco e, em cada "morte", ele visita vidas passadas, etc. A história até parece interessante, porém, achei a linguagem e o estilo textual um tanto densos e arrastados demais para o meu saco. E olha que, por se tratar de Jack London, eu peguei esse livro de boa vontade, pois ele escreveu Martin Eden, um dos melhores que já li até hoje. Mas dessa vez não emplacou. Por isso, não indico esse livro para você, ocupado leitor. Se quiser Jack London, pegue o próprio Martin Eden, Caninos brancos ou algum outro livro qualquer.
O segundo foi uma experiência tão frustrante que, apesar de ter acontecido já há alguns anos, nunca mais esqueci. Trata-se de Noites antigas, de Norman Mailer (1923-2007). Recordo que na época queria ler algo do Norman Mailer, pois ele é considerado um dos grandes escritores do New Journalism, estilo de jornalismo literário praticado nos Estados Unidos nas décadas de 1960 e 1970. Pelo resumo da contracapa, o livro parecia ser bom: ele conta histórias dos egípcios antigos, dando ênfase à questão sexual. Interessante. Lembrei-me do A mulher do próximo, livro-reportagem genial do jornalista e escritor Gay Talese. Porém, depois de ler cem páginas da obra de Mailer, desisti. A linguagem é muito chata, a história não anda, e é uma confusão de nomes egípcios que te dão um verdadeiro nó no cérebro. Confesso até que fiquei um tanto traumatizado com o Mailer por algum tempo. Depois dessa tentativa frustrada de leitura, levei alguns anos para encarar duas obras primas do autor: A luta e Um sonho americano. Essas sim, justificam a fama de Mailer como um dos grandes escritores do New Journalism americano.
Esses exemplos de livros ruins que às vezes cruzam as nossas vidas demonstram que é impossível acertar sempre, pois com mais frequência do que gostaríamos acabamos fazendo algumas más escolhas na vida. Em cada uma delas, no entanto, quase sempre é possível parar no caminho, respirar fundo, e partir para uma nova história, seja na leitura de um livro ou em qualquer outra situação. Um bom final de semana a todos.
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